28 agosto, 2006

discriminação etária

Discriminação etária no trabalho é tabu mas existe

diário de notícias
carla aguiar

procura-se colaborador(a) enérgico e entusiasta com experiência e idade até 35 anos." Os anúncios de emprego, repletos de exemplos como este, traduzem uma forma de discriminação menos mediática que a sexual ou racial, mas cada vez mais notória: a discriminação no acesso ao emprego com base na idade. É neste quadro que a Comissão Europeia começa a adoptar iniciativas para travar esta tendência, em esquizofrénico contraciclo com o aumento da esperança média de vida e com o adiamento da idade de reforma.

Bruxelas decidiu eleger 2007 como o "ano europeu da igualdade de oportunidade para todos", planeando uma agressiva campanha de sensibilização para um problema que ameaça o equilíbrio socio-económico da União Europeia. A ideia que se quer fazer passar é a de que "A Europa é mais forte com diversidade", seja ela geracional, racial, sexual ou religiosa. A campanha, que será patrocinada por uma cimeira europeia, segue-se à aprovação de uma directiva, em 2000, que pela primeira vez, abrange a idade no leque mais frequente de factores de discriminação, como o género, a raça, deficiência, religião ou orientação sexual. Mas muitos países pediram derrogações para a sua aplicação, especificamente no capítulo da idade, num sinal de que a idade é, ainda, um tabu económico e social.

Em Portugal, a última revisão do Código do Trabalho, de 2004, já consagra aquela directiva. Mas, como refere um relatório de balanço publicado no site da Comissão "o problema de Portugal é, muitas vezes, a falta de adequação entre a legislação e prática das empresas". Leitura semelhante faz o especialista em Direito do Trabalho Garcia Pereira, que, em declarações ao DN, chama justamente a atenção para o facto de que "uma coisa é a lei, outra é a prática". Aquele jurista não tem dúvidas em afirmar que "a discriminação etária no emprego existe em Portugal, embora seja difícil de provar". A atestar essa realidade estão os vários processos de constituintes em que esteve envolvido,como advogado, apontando, só a título de exemplo, sectores como a banca ou a consultoria.

O Código do Trabalho refere no seu artigo 22.º que "nenhum trabalhador ou candidato a emprego pode ser privilegiado, beneneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão, nomeadamente, de ascendência, idade, sexo, orientação sexual, estado civil, situação familiar, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência, doença crónica, nacionalidade, origem étnica, religião, convicções políticas ou ideológicas e filiação sindical".

Mas, como não há regra sem excepção, a lei estipula que já não há discriminação, " sempre que, em virtude da natureza das actividades profissionais em causa ou do contexto da sua execução, esse factor constitua um requisito justificavel e determinante para o exercício da actividade profissional, devendo o objectivo ser legítimo e o requisito proporcional."

A preferência das empresas pelos trabalhadores mais jovens foi explicada, sem rodeios, pelo director de um diário britânico, numa entrevista à BBC: "É muito simples, são mais baratos, porque ainda não sabem qual o seu valor de mercado e, porque não têm família, estão disponíveis para trabalhar mais horas."

A discriminação no mercado de trabalho estende-se, no entanto, para além do acesso ao emprego, tocando também os que já estão no mercado. Disso é exemplo a crescente vaga de "rescisões amigáveis" que as empregas dirigem, sobretudo, aos trabalhadores acima dos 50 anos. O sector bancário é um exemplo paradigmático, tendo lançado, sobretudo nos anos 90, milhares de trabalhadores para as reformas antecipadas. Mas a tendência mantém-se. Só entre 2000 e 2004 saíram 5900 trabalhadores dos cinco maiores grupos financeiros, muitos dos quais ao abrigo de pré-reformas. E as grandes empresas têm cada vez mais orgulho em publicitar, nos balanços sociais, que a média etária dos seus trabalhadores fica aquém dos 40 anos.

Uma estatística do Ministério do Trabalho, revela, por exemplo, que os especialistas das profissões intelectuais e científicas já estão mais representados no escalão entre os 25 e os 34 anos (49,7%) do que no escalaão entre os 35 e os 44 anos (24,2%), ou seja dobro. O que também traduz a cisão geracional das qualificações.

A colocação na agenda europeia da discriminação etária no emprego não deixa de estar relacionada com o aumento da esperança de vida, que está a obrigar vários países a aumentarem a idade de reforma, para aliviarem a pressão financeira do envelhecimento sobre os sistemas de Segurança Social.

Cada vez vivemos mais, mas somos empurrados cada vez mais cedo para fora do mercado de trabalho. Paradoxo que nuns casos chega aos divãs da psicanálise, com o sentimento de inutilidade a favorecer estados depressivos. Noutros, a retirada precoce da vida activa culmina mesmo em empobrecimento.
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